O exemplo de Teresa e Dona Glória
Marcus Vinicius Batista
A notícia de uma morte já me faz parar. A notícia da morte da mãe de alguém que prezamos me atrai a atenção e o cuidado para entender melhor o que aconteceu, como posso me aproximar.
O pedido de Teresa, esposa do meu primo João Carlos, para que ninguém fosse ao velório e ao enterro de Dona Glória, mãe dela, me comoveu, mudou meu dia, me trouxe lágrimas aos olhos quando comentei com minha esposa no café da manhã. Só sosseguei quando resolvi escrever após tanto pensar nas duas nos intervalos do dia.
Sei que, culturalmente, o ritual de morte é a última chance de nos despedirmos de alguém, ainda que o corpo seja a materialização simbólica, ainda que a presença de pessoas simbolize o apreço e/ou as convenções sociais em torno de um funeral. É parte do luto, um caminho de sentimentos e emoções variados em torno de uma perda. Um caminho sem receitas, construído por cada um a seu modo, no seu tempo.
No entanto, o que pensamos ou conhecemos não significa o que exatamente sentimos. Além de me sentir comovido com a perda da Teresa – pouco conheci Dona Glória -, não pude deixar de sentir como a ausência de pessoas poderia deixar o velório e o sepultamento mais tristes. Gosto muito de você, Teresa, compreendo e admiro sua sensatez e de seus parentes, mas me aborrece saber que um momento único como este foi impactado por uma epidemia, por um cenário incontrolável para qualquer pessoa.
Um funeral é uma celebração dos vivos. Ali, permite-se chorar – ato cada vez mais difícil nos dias atuais, os da imagem acima de tudo -, pode-se rir com as lembranças de quem se foi, falar em saudade, ser nostálgico, encontrar com quem não se vê há tanto tempo ou só se encontra em ocasiões assim. Um funeral nos une por algumas horas, mesmo que seja só uma “passadinha”.
No funeral, não sabemos o que dizer. E não temos obrigação alguma de dizer algo. Basta estarmos juntos, basta abraçarmos, basta um beijo, um sorriso e a presença física. Nenhuma palavra substitui esses gestos, nenhuma palavra é capaz de traduzir o impossível: nunca podemos nos imaginar no lugar de quem perdeu uma pessoa essencial, alguém que amamos no limite da dor.
Teresa, não me atrevo a dizer que sei o que sente. Não sei. Nunca saberei. Só posso dizer que lamento sua perda, que gosto ainda mais de você pelo seu gesto, que sempre estarei por perto, independentemente de um país inteiro que nos separa de você e do João. Hoje, testemunhei um gesto que poucos teriam após um golpe duro, num tempo difícil, quando precisamos uns dos outros sem poder conviver do jeito que estávamos acostumados.
Tenho apenas uma certeza enquanto te escrevo. Sua mãe, Dona Glória, aprovaria sua atitude e se sentiria orgulhosa das pessoas que colocou neste mundo por vezes hostil, por vezes marcado por individualismos e caprichos. Vocês, com o dia de hoje, provaram que entenderam o que é o amor entre pessoas. Amor é, por vezes, saber abrir mão. Onde estiver, Dona Glória deixou brotar um sorriso de agradecimento por hoje, amanhã e sempre.
Teresa, sinta-se abraçada. Estamos por perto, pois sabemos o quanto é importante apenas estar ao lado nesta fase. Em silêncio...Ou por este texto.
Comovente. Disse tudo e algo mais, para além das palavras.
ResponderExcluirsensível.... humanamente sensível
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